O tarô é uma linguagem simbólica que espelha a jornada humana. Quando a astróloga e psicóloga junguiana Liz Greene, em parceria com Juliet Sharman-Burke, concebeu o Tarô Mitológico, a proposta foi costurar os arquétipos dos arcanos às narrativas da mitologia grega, oferecendo contexto, personagem e enredo para cada carta. O resultado tornou-se um clássico: as imagens deixam de ser cenas isoladas e passam a integrar histórias que habitam o inconsciente coletivo.
Liz Greene e sua abordagem
Admiro profundamente o trabalho de Liz Greene e guardo vários de seus livros desde o início da minha jornada com a astrologia. Greene é uma das autoras mais influentes da astrologia contemporânea, conhecida por unir simbolismo astrológico, psicologia junguiana e mitologia. Psicóloga de formação, foi também cofundadora do Centre for Psychological Astrology em Londres, referência mundial na integração entre astrologia e psicologia. Entre seus livros mais notáveis estão Saturno: Um Novo Olhar para um Velho Demônio e Astrologia do Destino, obras que exploram as dinâmicas profundas do inconsciente.
A integração entre Tarô e Mitologia Grega
No Tarô Mitológico, cada carta é associada a uma figura ou narrativa da Grécia antiga. O Louco surge como Dionísio, deus do êxtase e da liberdade, representando o impulso vital que rompe convenções. O Imperador assume a forma de Zeus, o soberano do Olimpo, símbolo da autoridade e da ordem. Já a Morte é traduzida pelo mito de Perséfone e Hades, que evoca o ciclo inevitável de fim e renascimento.
Essa integração faz com que cada leitura se torne mais do que a interpretação de símbolos estáticos: o consulente entra em contato com histórias universais, onde deuses, heróis e arquétipos refletem dilemas humanos. Ao reconhecer esses mitos, acessamos uma memória arquetípica que atravessa culturas e ressoa em cada um de nós.
A presença da Astrologia
O olhar astrológico de Liz Greene atravessa todo o Tarô Mitológico. Não se trata apenas de um baralho ilustrado com cenas da mitologia: as escolhas de cada mito revelam a sensibilidade de quem enxerga as conexões entre planetas, deuses e arquétipos. Afrodite corresponde a Vênus, evocando amor, beleza e desejo; Ares, deus da guerra, ecoa na energia de Marte; Cronos, senhor do tempo, reflete a disciplina e os limites de Saturno. Esses paralelos não são acidentais: reforçam a ideia de que astrologia, mitologia e tarô são linguagens diferentes para narrar os mesmos processos de transformação.
Por que o Tarô Mitológico é especial?
O Tarô Mitológico se distingue porque não reduz as cartas a respostas rápidas ou fatalistas. Ele convida à reflexão e amplia o horizonte do autoconhecimento. Cada arcano apresenta uma narrativa em que o consulente pode se reconhecer, projetando seus próprios desafios e potenciais nos dilemas dos deuses e heróis gregos. Essa dimensão narrativa dá mais profundidade às leituras, permitindo que o baralho funcione como espelho da psique.
Os Arcanos Maiores do Tarô Mitológico
0 – O Louco – Dionísio
No Tarô Mitológico, o Louco é representado por Dionísio, o deus do êxtase, da transgressão e da liberdade. Filho de Zeus, Dionísio viveu uma vida marcada por passagens entre mundos, tendo sido perseguido, morto e renascido, carregando em si o arquétipo da ousadia e da ruptura das normas estabelecidas. Como arcano, o Louco traz essa energia de renovação e de risco: simboliza o salto para o desconhecido, o impulso de experimentar o novo mesmo sem garantias. Ele fala da confiança na vida e da coragem de caminhar além das convenções. O Louco lembra que o crescimento só é possível quando nos abrimos à aventura, aceitando que nem sempre haverá certezas no caminho.
I – O Mago – Hermes
Hermes, mensageiro dos deuses, é o arquétipo do Mago. Sua astúcia, sua capacidade de transitar entre o Olimpo, a Terra e o Submundo, e sua destreza em enganar ou negociar, fazem dele o símbolo da inteligência prática. Como Mago, Hermes aponta para a habilidade de usar os próprios talentos de forma criativa. Ele nos ensina que a palavra, o gesto e a intenção são ferramentas poderosas de transformação. Esta carta lembra que já temos em mãos os instrumentos necessários: cabe a nós usá-los com consciência, direcionando energia e recursos para manifestar resultados.
II – A Sacerdotisa – Perséfone
A Sacerdotisa se revela através de Perséfone, filha de Deméter e rainha do Submundo. Raptada por Hades e obrigada a dividir sua vida entre o mundo dos vivos e o dos mortos, ela se torna símbolo da dualidade entre consciência e inconsciente. No tarô, Perséfone como Sacerdotisa guarda os mistérios e nos convida ao recolhimento silencioso, ao contato com a intuição e à escuta do que está oculto. Sua carta é um portal para os segredos da psique, lembrando que a sabedoria profunda não é encontrada no ruído do mundo, mas no mergulho interior.
III – A Imperatriz – Deméter
A Imperatriz é Deméter, deusa da fertilidade, das colheitas e da nutrição. Mãe de Perséfone, ela simboliza o poder criador e a abundância que surge do cuidado. A carta fala de gestação, crescimento e realização, não apenas no sentido material, mas também em projetos, ideias e vínculos afetivos. Deméter ensina que tudo floresce quando é cultivado com amor, atenção e paciência. Como arcano, a Imperatriz evoca criatividade, prosperidade e a importância de reconhecer os ciclos naturais de plantar, nutrir e colher.
IV – O Imperador – Zeus
No papel de Imperador, temos Zeus, soberano do Olimpo, deus do raio e da lei. Sua imagem representa autoridade, estabilidade e estrutura. No tarô, o Imperador é o arquétipo da ordem estabelecida, da proteção que emana de regras claras e da responsabilidade que acompanha o poder. Zeus lembra que é preciso organizar, criar limites e estruturar bases sólidas para que a vida se desenvolva com segurança. Sua carta traz o convite para assumir o comando da própria existência, com disciplina e clareza.
V – O Hierofante – Quíron
O sábio centauro Quíron, mestre de heróis como Aquiles e Jasão, ocupa a posição de Hierofante. Conhecido por seu sofrimento incurável e pela sabedoria que brotou de sua dor, Quíron simboliza o arquétipo do mestre e do curador. No tarô, ele representa tradição, ensino e transmissão de valores. A carta indica a importância de buscar orientação, de aprender com aqueles que já trilharam o caminho e de compreender que o verdadeiro conhecimento nasce tanto do estudo quanto da experiência transformadora das próprias feridas.
VI – Os Amantes – Paris e Helena
O arcano dos Amantes é ilustrado pelo mito de Paris e Helena. Ao ser escolhido para julgar quem era a deusa mais bela, Paris entrega a maçã dourada a Afrodite, recebendo em troca o amor de Helena, esposa do rei Menelau. Esse ato desencadeia a Guerra de Troia. No tarô, os Amantes simbolizam a força do desejo, mas também os dilemas que surgem das escolhas. É a carta das decisões afetivas e existenciais que abrem caminhos e fecham outros. Representa a paixão arrebatadora, mas também a consciência de que cada escolha traz consequências, exigindo responsabilidade.
VII – O Carro – Ares
Ares, deus da guerra, conduz o Carro com energia impetuosa. Ele encarna a determinação, a coragem e a vontade de vencer. No tarô, essa carta é o arquétipo da conquista, do movimento e da superação de obstáculos por meio do foco e da disciplina. O Carro fala da importância de ter direção clara e firmeza para seguir em frente, lembrando que a vitória não se conquista apenas com força bruta, mas com autocontrole e domínio das próprias energias.
VIII – A Justiça – Atena
A deusa Atena, nascida da cabeça de Zeus já armada e plena de sabedoria, é a figura da Justiça. Protetora da cidade e estrategista, Atena traz a clareza de julgamento e o equilíbrio entre razão e intuição. No tarô, sua carta representa a busca pela verdade e pela imparcialidade. Indica momentos em que é preciso analisar com ética e assumir as consequências das próprias escolhas. Atena lembra que a verdadeira justiça não é punição, mas discernimento lúcido.
IX – O Eremita – Cronos
O arcano do Eremita é associado a Cronos, deus do tempo. Em sua figura está a sabedoria que vem com o passar dos anos e com a paciência dos processos naturais. No tarô, ele simboliza a introspecção, o silêncio fértil e a busca por iluminação interior. A carta mostra que amadurecer exige recolhimento e contemplação, que o tempo é mestre, e que a luz da lanterna do Eremita é encontrada quando aceitamos percorrer a jornada interior em solidão consciente.
X – A Roda da Fortuna – As Moiras
A Roda da Fortuna é associada às Moiras, as três fiandeiras do destino — Cloto, Láquesis e Átropos. São elas que tecem, medem e cortam o fio da vida, simbolizando os ciclos que estão além do controle humano. No tarô, a Roda fala das viradas inevitáveis do destino, da alternância entre altos e baixos e da necessidade de aceitar a impermanência. A carta lembra que tudo está em constante movimento, e que a sabedoria consiste em aprender a girar junto com a roda da vida.
XI – A Força – Hércules
A Força é ilustrada por Hércules, conhecido por seus doze trabalhos. Ele encarna a coragem serena e a determinação que superam desafios aparentemente impossíveis. No tarô, a Força fala de autodomínio, integração dos instintos e confiança diante das provações. É o lembrete de que a verdadeira força não é violência nem imposição, mas a capacidade de transformar medo em confiança e instinto em poder criativo.
XII – O Enforcado – Prometeu
O Enforcado é representado por Prometeu, o titã que desafiou os deuses ao roubar o fogo para dá-lo à humanidade. Como punição, foi acorrentado a uma rocha, tendo o fígado devorado todos os dias por uma águia, num suplício interminável. Esse mito ilustra o arquétipo do sacrifício consciente e da suspensão. No tarô, o Enforcado fala da necessidade de abrir mão do controle, de aceitar uma pausa ou mesmo um sofrimento que traz crescimento. É a carta da entrega, do olhar para a vida por outra perspectiva e da renúncia que abre espaço para uma nova etapa de evolução.
XIII – A Morte – Hades
Na carta da Morte encontramos Hades, o senhor do Submundo. Ele simboliza o final inevitável e a transição que não pode ser evitada. A túnica negra de Hades evoca o luto necessário, mas também a preparação para um novo ciclo. No tarô, a Morte não fala de destruição literal, mas do encerramento de fases, padrões ou relacionamentos que já cumpriram sua função. É o chamado à aceitação de que toda mudança profunda envolve perda, mas também oferece a possibilidade de renascimento.
XIV – A Temperança – Íris
A deusa Íris, mensageira alada do arco-íris, aparece na Temperança. Ela conecta céu e terra, transmitindo harmonia e mediação. No tarô, essa carta representa equilíbrio, moderação e integração de opostos. É o arquétipo da cura e da síntese, quando elementos diferentes se misturam para criar algo novo e harmonioso. A Temperança lembra que é na medida justa que encontramos serenidade, e que unir em vez de separar é o caminho da sabedoria.
XV – O Diabo – Pã
O Diabo é simbolizado por Pã, deus dos bosques, metade homem e metade bode, que dança ao som de sua flauta. Ele representa o poder dos instintos e dos desejos, mas também a sombra que projetamos fora de nós mesmos. No tarô, as figuras acorrentadas ao redor de Pã não estão realmente presas; poderiam se libertar a qualquer momento. O Diabo fala da escravidão aos vícios, ao medo e às ilusões, mas também lembra que o aprisionamento é, em grande parte, autoimposto. É o convite a reconhecer e integrar a sombra, em vez de ser dominado por ela.
XVI – A Torre – Poseidon
Na Torre aparece Poseidon, deus dos mares e dos terremotos, capaz de destruir estruturas com sua força implacável. A carta simboliza rupturas súbitas, crises e desmoronamentos de construções frágeis ou ilusórias. Embora dolorosa, a queda da Torre traz libertação: o que não era sólido precisa ruir para que algo autêntico seja reconstruído. Representa a experiência de ver certezas desmoronarem para abrir espaço ao real e ao verdadeiro.
XVII – A Estrela – Pandora
A Estrela é ilustrada por Pandora, a primeira mulher criada por Zeus como instrumento de provação. Ao abrir a caixa que recebeu como presente, libertou todos os males, mas no fundo permaneceu a esperança, que se ergue como luz. No tarô, a Estrela simboliza fé, serenidade e inspiração depois da crise. É o arquétipo da confiança em um futuro melhor, da capacidade de acreditar novamente após a dor e da renovação espiritual que restaura o sentido da vida.
XVIII – A Lua – Hécate
Na Lua vemos Hécate, deusa das encruzilhadas e guardiã da noite. Ela representa os mistérios do inconsciente, das visões e ilusões que emergem nas sombras. No tarô, a Lua fala de incertezas, enganos e projeções, mas também da intuição que guia na escuridão. É a carta da travessia noturna, em que precisamos discernir entre realidade e fantasia. Hécate lembra que os labirintos da psique podem confundir, mas também conduzem a revelações profundas.
XIX – O Sol – Apolo
O Sol é representado por Apolo, deus da luz, da razão e das artes. Ele simboliza clareza, vitalidade e expansão da consciência. No tarô, a carta do Sol fala de alegria, sucesso e realização. É o momento de confiança no caminho, de celebrar a vida e de expandir a energia criadora. Apolo dissipa as sombras e mostra que a clareza e a verdade são forças libertadoras.
XX – O Julgamento – Hermes Psicopompo
O Julgamento traz novamente Hermes, agora em sua função de Psicopompo, condutor das almas. Ele aparece com o caduceu entre duas colunas, diante de figuras que se erguem de sarcófagos. No tarô, essa cena simboliza o despertar da consciência, a revisão do passado e a colheita do que foi semeado. O Julgamento é reconciliação, perdão e chamado para renascer em um novo patamar. É a carta do exame interior, quando experiências antigas retornam para serem compreendidas e integradas.
XXI – O Mundo – Hermaphroditus
O Mundo é ilustrado por Hermaphroditus, figura que une masculino e feminino em uma única forma. Ele representa a totalidade e a integração dos opostos. No tarô, o Mundo simboliza conclusão, plenitude e realização de um ciclo. É o momento em que a jornada se completa, trazendo harmonia e abertura para novos começos. A carta mostra a celebração da unidade e a consciência de pertencer ao todo.
Conclusão
O Tarô Mitológico, criado por Liz Greene e Juliet Sharman-Burke, permanece como uma das contribuições mais originais ao estudo simbólico do tarô. Ao associar cada arcano maior a uma narrativa da mitologia grega, ele amplia o campo de leitura: não estamos apenas diante de cartas, mas de histórias vivas, que ecoam no inconsciente coletivo e revelam dilemas universais.
Esse baralho nos convida a enxergar nossa própria jornada refletida nos mitos. Cada escolha, cada ruptura, cada conquista ou renascimento é narrado pelos deuses e heróis que povoam as cartas. A presença da astrologia — visível nas divindades que também nomeiam planetas — reforça o elo entre as linguagens simbólicas, mostrando que todas apontam para os mesmos processos de transformação.
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